Dia do Sorvete: único mestre sorveteiro do Brasil faz revelações fortes sobre esta delícia

Francisco Sant’ana, único mestre sorveteiro do País, fala sobre o verdadeiro sorvete, desconhecido por muitos brasileiros.

O Dia do Sorvete aqui no Entre Cozinhas e Histórias não será muito doce e refrescante, será polêmico! Eu já falei que muitos chocolates vendidos no mercado brasileiro não podem ser considerados chocolates de verdade, tecnicamente. Chegou a vez do sorvete! 23 de Setembro é o dia desta delícia e não posso deixar de dizer umas boas verdades.

A foto é fofa, mas isso é crime, viu? Faz mal para os bichinhos!

Prepare-se para lidar com a dura realidade de que, talvez, você nunca tenha degustado o verdadeiro sorvete. Essa descoberta foi graças à conversa que tive com único mestre sorveteiro do Brasil,  o chef Francisco Sant’Ana, fundador da Escola Sorvete, a primeira e única escola independente de sorvete raiz, como ele chama. A conversa ocorreu por telefone em uma tarde quente em São Paulo, eu havia acabado de tomar um picolé industrializado, que depois descobri não ser picolé de verdade.

Para vocês terem uma idéia do quanto a arte do sorvete é complexa, mesmo após anos de estudo e trabalho, o Francisco Sant’Ana pode ser oficialmente considerado mestre sorveteiro apenas neste ano. “Somente neste ano posso dizer que sou mestre sorveteiro, porque fiz meu registro de sorveteiro na França e lá a Confederação Nacional dos Sorveteiros diz que você pode receber este título apenas dez anos após o registro efetivo da profissão”. Portanto, não basta fazer cursos apenas. “Tem gente que vai para Itália fazer cursos e volta se dizendo mestre sorveteiro, mas não é”, afirma. Francisco Sant’anna estudou cozinha no Rio Grande do Sul, confeitaria na Argentina, fez pós de confeitaria na Espanha e, finalmente, viajou para a França, onde foi o primeiro professor-assistente não francês na Escola Nacional Superior de Confeitaria da França. Ainda deu aula na Universidade do Sorvete, na Itália.O problema para ele é a falta de regulamentação no Brasil, que não determina parâmetros para definir como e por quem deve ser feito. “Aqui não há uma lei que determine quanto deve haver de morango em um sorvete de morango, muitas marcas apenas colocam corantes e saborizantes artificiais, enquanto que na França deve ter no mínimo 25% da fruta”, explica. Um teste é bater morango com leite, o resultado será uma bebida rosada quase branca, diferente da cor dos sorvetes industrializados deste sabor.

Desde que criou a escola, vem fazendo uma pregação, como gosta de dizer, para que se faça sorvete de verdade, com frutas, leite e produtos naturais locais. Um exemplo citado é o fato do Rio Grande do Sul ser um grande produtor de creme de leite. No entanto, de acordo com ele, pelo menos 95% das indústrias gaúchas usam gordura vegetal, o que prejudica a qualidade e o sabor. “Todas usam gordura vegetal, mas importamos marcas como Ben & Jerry’s e Häagen-Dasz, que usam gordura animal, e custam mais”, revela. Ou seja, em vez de buscarmos sorvete na Europa, ele destaca que poderia produzir um sorvete de qualidade igual ou superior no Rio Grande do Sul, que diminuiria custos aos consumidores e agregaria valor à nossa indústria. 

Outro ponto, não menos importante, é a saúde. Há produtos químicos ainda não considerados totalmente seguros. “Um sorvete de verdade, com frutas e leite, por exemplo, é um alimento, já o nosso, cheio de ingredientes artificiais, não é, faz mal”, destaca. Sant’anna afirma que enquanto a produção na Europa e nos Estados Unidos são determinadas por leis rigorosas, aqui se justifica tudo com o argumento do baixo custo. “Você pode seguir fazendo estes produtos, mas é preciso deixar claro no rótulo para o consumidor”, opina.

Como é um verdadeiro sorvete?

Um sorvete de fruta, por exemplo, é composto por água, fruta em percentuais elevados, açúcar e um elemento estabilizante, que pode ser natural, como farinha da alfarroba ou farinha de guar, usados desde o tempo dos romanos. Se for de chocolate, será leite, chocolate de boa qualidade, alguma gordura animal, que pode ser nata, e estabilizante. A partir disso a mágica acontece, com muitos cálculos para cada etapa e temperatura. Segundo ele, o que vemos aqui são corantes artificiais, açúcar em excesso, gordura vegetal e estabilizantes como o carbometilcelulose, substância que, de acordo com o chef, é cancerígena.

Os sorvetes ditos artesanais ou gelatos não ficam de fora. “O artesão deve fazer produtos exclusivos, selecionados manualmente, com cuidado, mas aqui vemos produtos chamados de artesanais produzidos a partir de misturas prontas”, revela. O maior problema é que hoje a formação de sorveteiros no País é a partir de grandes marcas. “Você tem as escolas das empresas, que vendem os saborizantes e demais ingredientes artificiais, e as escolas das marcas de máquinas, que ensinam a partir daqueles equipamentos”, explica.

Gelato X Sorvete

O Mestre sorveteiro revela que o termo gelato é apenas um nome gourmetizado. Gelato é sorvete em italiano. O singificado literal seria gelado, nome utilizado em Portugal para este doce, que em espanhol é helado. Em outros idiomas é a mesma lógica: Ice Cream em inglês (traduzindo literalmente seria ‘creme gelado’), Eis em alemão (se pronuncia ‘ais” e significa gelo). Aqui no Brasil que usamos uma palavra de origem diferente para denominar o mesmo produto. O que se convencionou como gelato, de acordo com o chef, é o sistema de venda, ou seja, o sorvete artesanal, feito para durar apenas um dia, a exemplo do que se faz na Itália, com ingredientes frescos.

Falando em países, o mestre sorveteiros explica algumas nuances entre as diferentes receitas. Em Portugal, ele conta que a base é de ovos, são produzidos sabores como ovos moles e pastel de natas. Os belgas também usam ovos, já na Alemanha estão em alta os naturais e orgânicos com as biogelaterias.

OUÇA O PODCAST DESTA MATÉRIA!

Publicidade
%d blogueiros gostam disto: