A história do sanduíche ícone de São Paulo

No aniversário de São Paulo, conto a história do sanduíche de mortadela, que virou símbolo da comida paulistana.

Sabe aquele brilho no olhar de quando alguém fala sobre o que realmente ama e se orgulha? Foi o que vi ao conversar com o Marco Antônio Loureiro, o proprietário do Bar do Mané, no Mercado Municipal de São Paulo, no centro da capital paulista. Não é para menos, foi lá que criaram o lanche que virou um dos símbolos da gastronomia paulistana: o sanduíche de mortadela. Não é um sanduíche qualquer, é aquele enorme que leva 350g de mortadela fatiada e que o pessoal adora fotografar para mostrar que é real. O estabelecimento nasceu junto com o Mercadão, em 1933. A inauguração do primeiro grande centro de compras da cidade estava prevista para 1932, mas, devido à Revolução Constitucionalista, naquele ano, foi adiada.

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Marco Antônio não esconde o orgulho de seguir a tradição sem perder qualidade.

A história do bar iniciou com Jeremias Cardoso Loureiro, avó de Marco Antônio, e o primo, Alberto Loureiro. Eles vieram de Portugal sem a família, que chegou depois. Ambos eram de Lamego, Norte de Portugal, onde exerciam a profissão de padeiro. Os imigrantes começaram a trabalhar naquele mesmo lugar do bar atual como funcionários. Entretanto, a situação durou cerca de 3 meses. O proprietário decidiu abandonar o negócio por acreditar que não iria vingar. “O Mercado era um monstro para a época, São Paulo era pequena”, conta Marco Antônio. O então dono ofereceu a oportunidade a Jeremias, que prontamente aceitou. Após isso, ele trouxe a esposa e o filho, Manoel, que seria o “Mané”.

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Localizado no Box 14 do Mercadão, o Bar do Mané virou referência.

Antigamente era comum os estabelecimentos levarem o nome dos donos, então passou a ser Bar do Jeremias. No entanto, ao chegar a vez do filho, o que estampou o letreiro foi o apelido pelo qual era conhecido por todos: mané. “Ele trabalhou dos 9 aos 79 anos de idade aqui e eu quis deixar esta homenagem”, revela Marco Antônio ao explicar o porquê de permanecer o mesmo nome. Assim seguiu a tradição. Marco Antônio, como o pai, começou na infância. “Meu pai me chamava quando havia muito movimento para ajudar, lavando copos, servindo café, e com meu filho foi a mesma coisa”. Apesar disso, os estudos nunca ficaram de lado. O filho, Willian, hoje com 31 anos, estudou Gastronomia para seguir com o negócio. “Partiu dele, não fui eu que obriguei”, conta o proprietário. Na família, o assunto à mesa é o Mercadão e o bar. O filho já trouxe algumas inovações ao cardápio, mas todo o cuidado é pouco para não perder a essência. “Eu transformei o nome do meu pai em uma marca e hoje todo mundo conhece como Bar do Mané, mas os clientes antigos ainda lembram do meu pai quando se fala o nome”. Seu Manoel só parou de trabalhar quando morreu, em 2005.

Como começou o sandubão?

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Dica: não deixe de provar os molhos de pimenta

Voltando às décadas anteriores, os frequentadores chegavam cedo para comprar frutas, verduras, legumes, carnes e peixes para seus hoteis, açougues, restaurantes e quitandas. “Vinham e acabavam passando no bar para tomar café. Foi aí que meu pai e meu avô tiveram a ideia de fazer lanches rápidos, pois os clientes sempre estavam com pressa”, explica. Os sanduíches já ficavam prontos no balcão e tinham tamanho “normal”, com duas ou três fatias. Os mais pedidos eram os de copa, salame ou mortadela.

A polêmica começou com o fim da Tabela da Sunab, que fixava os preços nos bares. Com a possibilidade de ajustar livremente os preços, seu Manoel reajustou os lanches, mas não aumentou a quantidade de recheio. Isso gerou reclamações, então surgiu a ideia de oferecer dois tamanhos: o sanduíche da tabela, tradicional e mais barato, e o lanche caprichado, com 100g de mortadela. “Na época, 100g era um exagero”, lembra Marco Antônio. Até que um dia, funcionários decidiram fazer uma brincadeira com um freguês e puseram muito mais fatias dentro do pão. A ideia foi aprovadíssima e, no boca-a-boca, o bar começou a ser procurado pelo “lanche grande”. Hoje, a atração leva 350g do ingrediente. O sucesso é grande, em oposição ao pequeno espaço de 45m² onde sempre funcionou. “Cai a ficha quando chegam pessoas de outros estados e países querendo provar”, ressalta o dono. Diversas celebridades já visitaram, o destaque vai para o tenista Roger Federer, em 2012. “Ele é muito simpático e atencioso, mas é claro que não comeu tudo”, brinca.

Isso tudo gera muita cobrança. “Temos um nome, precisamos manter a qualidade”. Marco Antônio chega diariamente às 2h30 da madrugada para não perder a tradição de servir o café da manhã aos feirantes a partir das 4h e, depois, aos primeiros clientes do dia. A mortadela é de uma marca selecionada e é entregue diariamente para estar sempre nova. “A gente sente orgulho, essa história se mistura com a da minha família, aqui é a minha casa”.

Ouça a versão de rádio desta matéria!

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O cardápio conta a história para que todos tenham dimensão da importância do local. O menino em frente ao balcão era um cliente e nunca conseguiram descobrir sua identidade.
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Autor: Entre Cozinhas e Histórias

Sou uma jornalista cosmopolita e apaixonada por curiosidades, histórias inusitadas e boa gastronomia. Comida boa não precisa ser cara e penso que a culinária diz muito sobre seu povo, faz parte da identidade de cada indivíduo. Diga-me o que comes e te direi quem és!

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